domingo, 25 de maio de 2014

Dos olhos abertos de um menino



Ele abriu os olhos. Respirou fundo.
O lugar era desconhecido, mas a sensação era familiar.
Sabia onde estava,com quem estava, o que deveria fazer e como fazê-lo.
Eles queriam caminhar na trilha.
Entre eles e a relização de seu desejo, uma grade. A grade de metal, embora alta e com uma cerca elétrica no topo, não era tão ameaçadora assim, então eles escalaram e pularam sobre ela.
Sem nem ao menos notar o quão fácil havia sido ultrapassar o obstáculo, ele percebeu que as coisas não continuariam tão simples quando viu que havia deixado a mochila do outro lado.
Suspirando e aceitando a situação, não havia nada a fazer além de escalar de volta e recuperar o objeto. É claro que desta vez, a cada tentativa, ele foi surpreendido pelo contato da cerca elétrica. E, mesmo que os choques não fossem o suficiente para impedi-lo de tentar mais uma vez, e outra, e outra, eventualmente foi preciso jogar a toalha.
Foi aí que ele fechou os olhos.


Ele abriu os olhos. Respirou fundo.
A clareira era bonita, a trilha tinha valido a pena.
Esperar pelos outros, no entanto, era um pouco menos divertido, então ele resolveu voltar e ver o que os estava atrasando.


Retornando pelo caminho, ele ouviu as vozes antes de ver o movimento, e viu o movimento cessar antes de poder definir as silhuetas.
E então, com o afastar de um galho mais baixo, ele viu a cena por inteiro.
Os olhares chocados, a cena estática. Tudo tão previsível.
Se aproximou e olhou para baixo, seu corpo inerte no chão.
Respirou fundo.
E fechou os olhos.

Ele ainda estava na clareira, e mesmo após imaginar o pior cenário possível para o atraso dos amigos, a visão da realidade conseguiu ser ainda pior.

Retornando pelo caminho, ele viu primeiro a fumaça, depois os troncos incandescentes.
Eram troncos enormes de árvores em chamas, quase como se ainda estivessem plantados.
Gritando para as pessoas ao redor para tentar descobrir o motivo, recebeu a resposta de que
os garis tinham pedido que se fizesse uma fogueira para queimar o lixo. A fúria foi crescendo
como as chamas à sua frente, até tingirem de vermelho seu rosto e seus olhos.
Ele só percebeu que estava correndo quando diminuiu a velocidade para pegar a primeira coisa que encontrou pela frente: uma pá. De pá na mão, e sem camisa (que ele também não reparou quando tirou), pôs-se a correr ainda mais desesperamente na direção dos responsáveis.
Quanto maior a velocidade, maior a distância , maior a angústia pesando em seu peito.
O sentimento era de urgência. Ele tinha que chegar lá.
Junto com o som do vento em seus ouvidos, veio um outro som, gutural, quase monstruoso. Um grito de dor. Ele ainda estava correndo quando percebeu que o grito saía de sua própria boca. Só então fechou os olhos.

Ele abriu os olhos. Respirou fundo. 
E reconheceu onde estava. Sua cama, seu quarto.

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