Normalmente, eu sou a louca da viagem.
Aquela que acha que dormir é para os fracos, que todas as vistas devem ser vistas - e devidamente registradas, seja em fotografias, filmagens ou mesmo na memória; que todos os passeios devem ser feitos, e todos os lugares visitados - especialmente as igrejas e os museus e os parques; que toda comida deve ser experimentada, ao menos uma vez.
Eu penso que cada viagem é única e que pode ser a última, e que eu posso nunca mais ter a chance de visitar aquele lugar de novo, e ai de você se ficar no meu caminho, se preferir deitar ao sol ao invés de caminhar ponta a ponta da praia atrás daquela gruta espetacular.
Eu estou aprendendo a apreciar os momentos inertes, mas ainda não. Eu ainda preciso estar em movimento, preciso usar minhas pernas fortes, minha mente sã, meu vigor. Quando eu estiver velha, daí eu sento, descanso, resolvo acordar bem tarde no meio de uma viagem.
Isso me deu momentos incríveis. Eu andei de barco sozinha até a estátua da Liberdade,mesmo sem poder subir por ela; percorri Paris em seus pontos turíticos - sem tempo para entrar em nenhum deles; comi queijos e mais queijos e carne de coelho; visitei 4, 5 lugares num mesmo dia, com tenis amortecedores pra aguentar o passo apressado, fiz coisas que nunca imaginei q faria, como nadar com tubarões e andar em cada um dos brinquedos do Walt Disney World - mesmo os mais chatinhos pra crianças pequenas.
Nessas idas e vindas, eu me diverti. Muito. Não me entenda mal. Mas às vezes tenho a sensação que a corrida por fotos e por ver tudo que meu olhos possam alcançar tenha me tirado a chance de observar os detalhes. Eu vi o jardim, mas perdi o ruflar de asas da borboleta.
Essa ultima viagem foi diferente. O objetivo da viagem era ir a duas reuniões, e eu me planejei pra ficar na cidade por dois dias a mais que o necessario - um antes e um depois. Fiquei hospedada na casa de uma amiga, que mora com os pais e uma irmã gêmea. Ambas as irmãs são extremamente atenciosas e preocupadas com a segurança.
Por varios fatores, por conta da chuva, dos compromissos e da propria segurança, passamos a maior parte do tempo em casa. Mesmo q eu me sentisse, num primeiro momento, desperdiçando meu tempo, que poderia ser gasto em desvendar a cidade, acabei respirando mais fundo e olhando outras coisas.
Eu vi os detalhes da casa, e como ela tem cheiro de lar, com suas fotos e suas porcelanas. Eu vi a rotina de uma familia que poe e tira a mesa simultaneamente de forma tão natural que seus movimentos parecem ensaiados, quase passos de dança. Vi duas irmãs que fazem favores a todo momento uma pra outra, mesmo que acabem discutindo quando é pra jogar cartas.
Ao invés de fotografar a vista, eu fotografei o gatinho de olhos verdes e arco-iris que despontou por trás da mangueira do vizinho. Ao invés de observar as trilhas dos parques, eu observei as curvas do corpo do gato ao espreguiçar dos bigodes até a ponta do rabo.
Eu vi como bocas se mexem, como dedos se fecham, como a chuva cai, como o sol desponta primeiro pelo refleto dos poucos predios altos que estão sendo construídos no bairro.
E assim, entre pessoas e lugares e bichinhos, eu fiz uma viagem que não teve visita guiada nem vistas panoramicas, mas nem por isso deixou de ter um vislumbre sobre a vida de outros nem uma vista que valha a pena ser vista.
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