segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

De coisas do fundo da gaveta #4 - Pablo

Pablo
Há algum tempo venho criticando a atitude de minha irmã mais nova. Ela tem doze anos, mas ainda se fecha em alguns incompreensíveis comportamentos infantis, como pirraças e a estranha forma de tratar os meninos como extraterrestres. Uma vez que eu sempre tive mais amigos que amigas, essas atitudes me parecem muito esquisitas.
Outra coisa de que sempre reclamo é a falta de familiaridade da pequena com livros, o que eu, como leitora inveterada desde os 4 anos de idade, considero um insulto pessoal. Ela já está no segundo livro da semana, então esse assunto eu posso descartar por um tempo, mas a infantilidade ainda me irritava profundamente. Até ontem.
Temos 3 vizinhos novos no prédio e, embora estejamos nos reunindo para comemorar o Natal, ainda não conhecemos todos. Isso inclui nossos únicos vizinhos de andar que, até ontem, chamávamos de “os italianos” porque – adivinhem- eles falam italiano.
O único vislumbre de comunicação com eles acontecia quando minha irmã e meu pai se divertiam observando a carinha medrosa do gato deles na nossa janela, se escondendo assim que os via, mas voltando a olhar devagarzinho, curioso.
Bem, acontece que anteontem à noite, enquanto meu pai levantava para tentar fazer algo em relação aos mosquitos que parecem querer devorar os branquelos como ele, viu um vulto na sala. Chegando mais perto, percebeu que era o tal gatinho. Tentou atrair o bichano, mas esse fugia, com medo.
Míope convicto, meu pai resolveu buscar os óculos para tentar pegar o bichinho mas, quando voltou à sala, ouviu um barulho e o dito cujo não estava mais lá. Correndo até a janela, por pensar que o gato havia caído, meu pai até olhou para baixo (moramos no terceiro andar), mas não o viu. Presumiu, então, que o bichano havia voltado pra casa.
No dia seguinte, recebemos a visita desesperada da dona do gatinho (Pablo é seu nome - nome do gato, não da dona), perguntando se havíamos visto o bichano. Procuramos em vão aqui em casa e minha irmã, como toda criança que se preza, se ofereceu para ajudar a procurá-lo no térreo.
Com a oportuna informação de que o bichano só entendia italiano, saíram (minha irmã, a dona e o filho) a gritar Andiamo, Pablo, sem nenhuma resposta. Minha irmã chegou a propor a procura no pequeno compartimento embaixo das escadas do prédio, mas o porteiro afirmou que o gato não poderia passar pela porta.
Ao voltar, sem achar nem sinal do bichinho, minha irmã veio ralhar comigo por não ajudar a procurar, o que eu retruquei dizendo que havia ajudado a procurar aqui em casa, embora soubesse que ele não estava aqui.
A essa afirmação de incredulidade, a pequena disse: “ Mas assim você nunca ia achar, sabendo que ele não estava! Você tem que procurar querendo que ele esteja lá!!”
Ouch!
Depois dessa bronca muito bem dada pela pequena, resolvi pedir a Deus (querendo que ele atendesse) que o Pablo fosse encontrado.De qualquer maneira, pensei, ele já fez o que tinha que fazer, nos apresentou a nossos vizinhos...Agora Você pode deixá-lo voltar, ok?
Hoje de manhã, ao sair de casa, perguntei ao porteiro se haviam achado o gatinho. Ele disse que sim, o bichano havia se escondido no cômodo sugerido pela pequena. Eu sorri de lado e aprendi duas lições muito importantes.
Que pedir só funciona se você acreditar que vai ser atendido.

E que infantilidade não é tão ruim assim.

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